9 de agosto de 2012

Diablo III (PC) (**)


Houve uma época, nos anos 90, em que a Blizzard era a softwarehouse mais corajosa e competente do mercado. Ela revolucionou os jogos de plataforma com o sombrio e claustrofóbico Blackthorne em 1994, inovou nos RTS com Warcraft no mesmo ano e, em 1996 lançou Diablo, um dos games mais maduros, sombrios e divertidos de sua época.

Isso em uma era onde games ainda eram considerados "brinquedos", e poucos, muito poucos, tinham coragem sequer de mencionar a palavra "demônio" como xingamento dentro do jogo. A Blizzard não só estampou o nome na capa como recheou o game de símbolos satânicos como cruzes invertidas e pentagramas, e ainda montes de pessoas mortas, sangue, tripas, tortura, topless e violência explícita. Logo na primeira cutscene já aparecia um corvo comendo o olho de um cadáver, em gráficos que, para a época, eram extremamente bons.

Longe de querer vender apenas em cima da polêmica, Diablo também era um dos melhores (senão o melhor) RPG isométrico daquela década. A narrativa bem costurada, a trilha sonora assustadora, os ótimos gráficos e efeitos sonoros eram aliados a um maravilhoso sistema aleatório que sempre gerava cenários, labirintos, armas, inimigos e até distribuia as missões de maneira diferente cada vez que você começava um jogo novo.

O sucesso foi tanto que em 2000 a Blizzard lançou Diablo II. Apesar de também divertido, o jogo não chegava aos pés do primeiro, sendo muito mais brando, com menos sangue, violência, satanismo e peitos de fora e mais "colorido" que o anterior, variando o ambiente medieval gótico com fases na selva e no deserto.

Agora, depois de 12 anos, a Blizzard chega com o terceiro jogo da série. Ele presta? É bom? É polêmico?


Polêmico sim, mas não do modo que você imaginava...

Para a decepção de muitos (incluindo eu mesmo), Diablo III foi feito no polêmico molde de Darkspore (que inclusive foi baseado no primeiro Diablo...), ele é um jogo singleplayer...online. Na verdade quando você compra o jogo, você está comprando apenas um CD de instalação e o acesso aos servidores da Battle.net. O jogo em si você não comprou, ele fica bem guardado lá na sede da Blizzard, que só te disponibiliza os cenários, criaturas, equipamentos e outras partes do jogo onde seu personagem está, por demanda, conforme você joga.

Ou seja, basta uma queda rápida na internet, ou qualquer problema com sua conexão para seu jogo cair. E claro, todos sabemos o quanto as conexões de internet são confiáveis, estáveis e nunca dão problema, certo?

E não basta apenas sua internet ter problemas, qualquer coisa que aconteça com a Blizzard, incluindo panes e manutenção dos servidores, derruba seu jogo. E não estamos falando do multiplayer ou de um MMO, que a pessoa já joga ciente de que isso pode acontecer, mas de um game singleplayer.

E pra variar os primeiros meses após o lançamento do jogo foram abarrotados de bugs, quedas de servidor e erros de conexão que derrubaram não só os servidores de Diablo III, mas também os de World of Warcraft e Starcraft 2...

Seu jogo singleplayer... quando a Blizzard e a sua provedora de internet quiserem...

E os problemas com conexão não param por aí. Diablo III tem mania de bloquear sua conta toda vez que acha que você... não é você. Digamos que você comprou e joga todo dia a noite, basta logar um único dia pela manhã e pronto, conta bloqueada e você desejando que não tivesse escrito qualquer besteira como sua "pergunta secreta" na conta da Battle.net quando fez ela pra jogar Starcraft a mais de uma década atrás...

Passando o problema da conexão, vamos ao jogo em si. Diablo de 1994 deu origem a uma série de outros jogos mais ou menos inspirados nele, com mecânicas semelhantes e jogabilidade praticamente idêntica. Eis que Diablo III resolveu beber na fonte dos jogos Diablo-like, incorporando coisas desses jogos, como cenários com partes que vão quebrando ou caíndo conforme você anda ou inimigos que escalam muros e aparecem de dentro de esgotos.

Fora isso há pouca diferença do Diablo II, e as que existem nem sempre são para melhor...

Um exemplo é o sistema de habilidades dos personagens. Enquanto nos primeiros dois jogos da série você escolhia o que melhorar no seu personagem (Força, Vitalidade...) e em Diablo II você escolhia as magias/habilidades que ele iria ganhar cada vez que subisse de nível, neste jogo você não pode optar por nada disso, o que diminui as estratégias que eram feitas nos outros e a personalização do personagem. Ao invés disso você tem "slots" para habilidades (os dois botões do mouse e os números do teclado de 1 a 4) que pode equipar com diferentes magias ou habilidades que são liberadas a cada nível. Prático, mas nem de longe tão divertido quanto os combos e árvores de progressão de Diablo II...

As classes de personagem também mudaram, ficando apenas o Bárbaro do Diablo II e ganhando a compania de um Witch Doctor (xamã, capaz de invocar zumbis), um feiticeiro (para lançar magias de área), um monge (lutador corpo-a-corpo) e um caçador de demônios (lutador à distância). Cada um desses personagens pode ser escolhido na versão feminina ou masculina.


Diablo III... praticamente Diablo II ainda mais light...

Como aliados do protagonista há três personagens: um templário, um ladino e uma maga, cada um com suas próprias histórias paralelas e habilidades. Embora divertidos, esses personagens não podem ser equipados com armaduras, botas, luvas e elmos que você encontra ao longo do jogo, apenas com armas, anéis, medalhões e itens específicos pra eles...

Diablo III tenta implementar a mesma idéia de cenários/monstros/itens/labirintos aleatórios de seus anteriores, mas, além de ser menos versátil do que o primeiro Diablo (mais nos moldes de Diablo II), ele ainda comete um grave erro ao tornar aleatórios locais onde seu personagem já esteve...

Imagina que você está jogando, quase terminando de explorar uma área e de repente sua internet cai, ou dá problema no servidor da Battle.net ou qualquer coisa assim e seu jogo desconecta. Quando você voltar a jogar, o local onde seu personagem está será totalmente diferente, inexplorado e lá vai você denovo ter que procurar seu caminho pelo que seria a mesma área, pela trocentésima vez...

Além de ser um pesadelo para quem gosta de "zerar o nível", matando todos os monstros e pilhando todos os tesouros das proximidades, isso não faz o menor sentido dentro da narrativa. Seu personagem é esquizofrênico? Ele esqueceu onde estava? O mundo está mudando conforme ele anda? Em Diablo fazia sentido, pois cada vez era uma história nova começando... mas em Diablo III isso ocorre ao longo do jogo em andamento... é um tanto frustrante.

"Olá, estamos em 2012... o fogo do Diablo 1 era mais convincente em 1996!!!"

Em termos de gráfico, Diablo III não se distingue muito do anterior Diablo II. Embora tenha ficado mais "colorido", com tons mais berrantes e menos escuros do que os do primeiro Diablo, o jogo não teve melhoras nos modelos. Vistos de perto eles parecem terrivelmente mal feitos, cheios de arestas, pontas e ângulos que não deveriam ter sobrado da primeira modelagem tridimensional. Aparentemente o jogo caminhou para o mesmo estilo "toscão" e pouco realista de Warcraft 3.

E seguindo seu "irmão" RTS, Diablo III conseguiu ser ainda menos violento e maligno que seus antecessores. O vilão Diablo mal aparece no jogo, e oponentes que tinham nomes de demônios do cristianismo, como Mefisto e Baal pouco são mencionados. Os novos vilões não parecem ameaçadores, e na verdade são mais dignos de pena do que de uma boa luta (Maghda? Bruxa com asinhas de borboleta? WTF?).

Os efeitos sonoros são medianos e a trilha sonora é até bonitinha, mas nada que se compare às músicas épicas e sombrias do primeiro game da série.

Aparentemente também a dificuldade do jogo foi abaixada enormemente. Em Diablo e Diablo II, mesmo na dificuldade mais fácil, era bastante trabalhoso passar de algumas partes ou inimigos específicos. Aqui o nível de dificuldade normal é pateticamente fácil, e nos outros você praticamente depende de ter itens fortes... e então entra o olho gordo da Blizzard, que inventou uma "casa de leilões" onde você pode leiloar seus itens ou comprar itens de outros jogadores com dinheiro real.

Sentiu cheiro daquelas "fazendas de gamers" chinesas onde pessoas são obrigadas a jogar o mesmo jogo interminavelmente apenas para conseguir itens poderosos para seus patrões venderem por centenas de dólares e pagarem míseros centavos aos jogadore? Eu senti.

"Tudo o que eu queria em Diablo III era uma sala de leilões onde eu poderia vender meus itens ou comprar novos com dinheiro de verdade" - Absolutamente ninguém, sobre Diablo III
A narrativa, bastante satisfatória (não tão boa quanto Starcraft 2 Wings of Liberty...), leva seu personagem à Tristram, a cidade do primeiro jogo, em busca de um meteoro que teria caído no local. Ao longo de quatro atos ele passa também por Caldeum, uma cidade no deserto, vizinha da que já foi visitada em Diablo II, pelo Monte Areat, visitado na expansão de Diablo II e, por fim, no Paraíso, morada dos anjos.

Muito mediana e linear, a narrativa empolga pouco, mas a diversidade de cenários, poderes, habilidades e personagens vai manter você querendo jogar até ver os créditos finais, e talvez te tragam de volta para experimentar outro personagem.

Após doze anos de espera, Diablo III decepciona bastante, com sua distribuição problemática (você nunca compra o jogo "de verdade", só acesso a ele pela internet, pra jogar sozinho...), dificuldade inconstante, niveis que se alteram durante a partida, cores vibrantes e puritanismo em excesso. Apesar de ser aquele bom e velho RPG isométrico de combate e pilhagem, Diablo III se perde das suas origens e fica parecendo mais um Diablo-like como Torchlight e Darkspore do que um legítimo sucessor dos primeiros jogos da série. É divertido quando você consegue jogar sem quedas de internet ou bugs, mas não tem, nem de longe, a força que o primeiro game da série teve.


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